Tradução

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

A CASA DE MICA


...Naqueles dias não havia rei em Israel:
Cada qual fazia o que parecia direito aos seus olhos.
(Juízes, 17)

            Esta passagem do Texto Sagrado do Cristianismo se refere a um tempo em que o povo hebreu, recém-saído de um período de dois mil anos de cativeiro no Egito, era um povo nômade, em meio ao deserto.
            Como nesses difíceis tempos bíblicos, vivemos, hoje, um processo semelhante. Sob os efeitos da globalização econômica, somos convocados à convivência diária com uma multiplicidade de costumes e crenças, desde os instituídos pelos imigrantes e escravos que aqui aportaram, para formar o caldeirão cultural que hoje é o Brasil, até os novos cultos que vêm surgindo a cada dia. Esta liberdade cultural, ao mesmo tempo em que é um avanço civilizatório, que permite que caminhemos em direção à autenticidade e à unidiversidade, traz-nos, também, dificuldades de convivência com o diferente, sempre que consideramos que a nossas crenças são melhores e mais corretas do que as dos outros. Silenciosamente, estamos a caminho da exacerbação do sectarismo religioso, correndo sérios riscos de que uma nova inquisição seja instalada pelo fundamentalismo religioso.
            Isto coloca nas mãos dos líderes de todas as religiões cultuadas no Brasil, a delicada e importante tarefa de esclarecer os seus fiéis, quanto às questões mais profundas que constituem as práticas da fé. Num país de escolaridade precária como o nosso, a ignorância constitui a besta apocalíptica, que se não for dissolvida à luz do conhecimento, manterá nosso povo aprisionado pelo medo, diante de tudo aquilo que desconhece, personificado pela figura medieval de satanás. Os líderes religiosos são os privilegiados que têm acesso ao conhecimento e à cultura de outros povos e tradições, cabendo-lhes, através da conscientização, mostrar que a religiosidade transcende a forma como cada religião é praticada e que, em essência, todos buscam, igualmente, o sentido de religar-se com um Deus Único.
            Nestes dois mil anos de Cristianismo, nunca se viu tanta diversidade de práticas religiosas. A cada dia, em cada esquina, surge um templo com uma denominação diferente, sempre que os seus líderes divergem em algum ponto da doutrina ou em alguma questão econômica, fator essencial do mercantilismo religioso. Como na casa de Mica, cada qual faz o que parece direito aos seus olhos, levando consigo uma multidão de cegos espirituais, que temem a Deus e, assustados, podem pisar naqueles que são os seus semelhantes, mas que são identificados e rejeitados como diferentes; como os inimigos que cultuam outro deus, como se Deus pudesse ser dividido em pedaços: O meu Deus, o seu deus... O meu com D maiúsculo, o seu com d minúsculo.
 Sabemos que na história da humanidade, sempre que o outro é desvalorizado no seu saber e na sua cultura, facilmente, em nome de Deus, ele pode ser levado à fogueira, não para que morra, claro, mas para que sua ”alma seja purificada”. Em todas as guerras, sejam econômicas, políticas ou religiosas, os fins justificam os meios...
Talvez, como solução para este problema que se avizinha, pudéssemos, todos, tornar-mo-nos verdadeiros Cristãos, reunindo-nos em torno da Presença do Mestre Jesus, que através do Novo Testamento, nos deixou uma mensagem de amorosidade e compaixão para com os diferentes, dizendo-nos: Ama a Deus sobre todas as coisas, e ao próximo como a ti mesmo..

Sueli Meirelles: Especialista em Psicologia Clínica. Pesquisadora de Fenômenos Psicoespirituais. Consultora em Desenvolvimento Humano, Saúde Integral, Ecologia Integral, Educação para a Paz e Implementação de Projetos Sociais.