Quando
falamos em vida a dois, pensamos num casal, num homem e numa mulher, que
decidem, por diferentes razões, compartilhar suas vidas. Aquilo que parecia uma
proposta simples de compartilhar duas vidas, gradativamente começa a adquirir
uma complexidade que, na maioria dos casos, resulta num intrincado novelo, onde
os fios se multiplicam, sem que se saiba exatamente com eles surgem. Muitas
vezes esses fios formam nós, cuja única solução parece ser o corte definitivo
da separação. Mas, por que isto acontece?
Em
primeiro lugar, o que chamamos “vida a dois” é um relacionamento que tem como
modelos os pais do casal, com seus aspectos positivos e negativos de
personalidade. A mulher tentará reproduzir o que tenha sido positivo na
personalidade de sua mãe; desejará que o marido seja parecido com o seu pai, em
seus aspectos positivos. Inconscientemente, repetirá os aspectos negativos da
personalidade de sua mãe e desaprovará os comportamentos do marido que sejam
parecidos com os aspectos negativos de seu próprio pai. O marido, por sua vez,
reproduzirá este mesmo quadro, fazendo com que o relacionamento a dois se
transforme num relacionamento a seis: Os pais de ambos, mais o casal. Como se
isto não bastasse, cada um dos cônjuges pode predominantemente ser visual,
auditivo ou sinestésico, privilegiando aspectos que talvez para o outro não
sejam significativos. Uma esposa visual irá valorizar decoração e filmes,
enquanto um marido sinestésico irá preferir sentar-se à mesa de um bar, para
alguns petiscos e um bom bate-papo, que deixará a esposa (visual) preocupada
com a dieta e a forma física. Temos agora um relacionamento entre seis partes
de cada lado: o cônjuge, seus pais e seus três canais sensoriais (visual,
auditivo e sinestésico). Além disso, em cada um dos cônjuges interferem três
partes psíquicas: O Pai Internalizado (conjunto de regras e valores, que
estabelecem o que é certo ou errado), o lado adulto que pondera, avalia e
decide, e o lado criança, que representa a parte emocional, movida pelos
desejos inconscientes. Teremos, assim, nove partes de cada lado, o que
significa, matematicamente, oitenta e uma possibilidades de atritos.
Se
as duas partes psíquicas responsáveis pelas regras entram em conflito, teremos
uma disputa de poder entre o casal. Se num dos cônjuges predomina este lado de
regras, tendo como contrapartida a criança interna do outro, as brigas serão
entremeadas por mal-criações por parte do cônjuge mais imaturo. Se a criança
interna de um for submissa, irá obedecer ao pai internalizado do outro cônjuge,
transformando o casamento num relacionamento filial. Se os dois tiverem o
predomínio da criança interna, o relacionamento será marcado pela
irresponsabilidade, de ambas as partes. Some-se a tudo isso as expectativas que
cada cônjuge cria em relação ao seu parceiro ou parceira, e ainda, as metas
pessoais da vida de cada um, e teremos a explicação para o alto índice de
separações que reduzem os mais lindos sonhos dos tempos de namoro, a um pacote
de decepções de parte a parte.
Quando
promovemos a análise da linguagem de um casal, sejam namorados, noivos ou
marido e mulher, identificamos os pontos de conflito que muitas vezes
transformam a vida a dois num campo de batalha, em que o outro se torna o
depositário das questões emocionais mal resolvidas na infância de cada um.
Trazer estas questões à consciência é o primeiro passo para libertar o outro de
expectativas que talvez ele ou ela jamais possa vir a satisfazer, para
tornar-se um ser humano inteiro e responsável por sua própria felicidade. A partir da sua auto-realização e do
redirecionando da vida pessoal para metas que só dependam da própria pessoa e
que, poderão ser compartilhadas com alguém que também busque concretizar seus
próprios ideais, duas pessoas realizadas
e livres dos fantasmas de suas histórias de vida têm mais chances de serem
felizes juntas.
SUELI MEIRELLES
Nenhum comentário:
Postar um comentário